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segunda-feira, 30 de dezembro de 2013

Dir-te-ei por estas palavras

Não a acordes de manhã. Nunca o faças. Quando a conheceres suficientemente bem, saberás que o despertador dela toca por quatro vezes. De quinze em quinze minutos. E habitualmente só se levantará quando o último tocar e ela estiver já atrasada para viver. Saberás com o tempo, que ela precisa de ir acordando. Não acorda simplesmente. Não fales de mais logo pela manhã. Não o faças. Nem sequer te aproximes demasiado para a abraçar ou beijar. Saberás, também com o tempo, que estarás a sufocá-la e a tirar-lhe o ar que tanta falta lhe faz para ser feliz. Ela precisa de ir acordando, lembra-te. Não acorda simplesmente. Se quiseres preparar-lhe o pequeno-almoço de surpresa, fá-lo composto de fruta. Saberás com o tempo que ela não se sente bem se comer demasiado. Diz que as bocheichas crescem e se sente gorda. Verás que não, que por mais que ela diga isso, tu achá-la-às, se a amas, a mulher mais bonita do mundo. Não lhe ligues demasiadas vezes ao longo do dia. Achará, por melhores intenções que tenhas, que a estás a tentar controlar e, novamente, a sufocá-la. Aprenderás com o tempo, que gostará que lhe ligues em determinadas alturas do mês, em determinadas horas do dia. Diz-lhe que a amas as vezes suficientes para que tu próprio não te esqueças disso. Por vezes ela poderá ser uma pessoa fria e terás de saber viver com isso. Não o fará por mal. Saberás isso com o tempo. Haverá alturas em que deixará cair essa capa de gelo e será das pessoas mais sensíveis que alguma vez conhecerás. Saboreia cada um desses momentos. Um deles poderá ser o último. Quando esse dia chegar, lembra-te. Ela não acordou simplesmente para ti. Lembra-te disso. Lembra-te que ela não acorda simplesmente. Que precisa de ir acordando. E, obviamente, não acordou para ti. Vai apenas acordando. E apenas o fez, porque a deixei adormecer. Porque deixei que dormisse. Porque não deixei que o despertador tocasse quatro vezes; Porque a quis cobrir de beijos e abraços logo pela manhã; Porque quis que comesse mais que uma manga descascada ao pequeno-almoço; Porque precisei de ouvir a sua voz vezes de mais ao longo dos dias, caso contrário quase não saberia respirar; Com medo de me esquecer que a amava, ousei denunciar-lhe demasiadas vezes esse sentimento. Lembra-te que nada sabes sobre ela. E mesmo que passes uma vida inteira a seu lado, continuarás a não saber nada. Nunca a conhecerás. Da mesma forma que ela simplesmente não acorda – vai acordando – também nunca a conhecerás por completo. Irás sempre estar a conhecê-la. E no dia em que deixares de entender isso, ela começará a adormecer e tu, para a acordares, estarás a descascar-lhe manga e a fazer torradas pela manhã; estarás a ligar-lhe a toda a hora, mesmo sabendo que ela não te quer falar; estarás a dizer-lhe que a amas e a esperar que te diga o mesmo. Estarás a esperar. A esperar. E nada vai acontecer. E quando deres por ti, estarás a escrever um texto, com o título, a ti que nada sabes, e a deixar esse legado a quem depois de ti não quiser deixar o despertador tocar quatro vezes.

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